11/08/2012 - 17h40
Este domingo terá um significado muito especial para britânico David
Harrad e o brasileiro Toni Reis. Depois de quase sete anos tentando
adotar juntos um filho, eles conseguiram, e agora estão preparando um
belo almoço para comemorarem o primeiro Dia dos Pais com o menino
Alyson.
David e Toni conversaram com a Agência de Notícias da Aids e contaram
detalhes sobre esta nova experiência. Segundo eles, em casa, a educação
com “dois pais” precisou apenas de um arranjo familiar, mas como fora
Alyson pode vir a enfrentar preconceitos, estão conversando bastante com
o garoto. “É importante fazer um paralelo com outras formas de
discriminação que também existem contra quem não se enquadra na norma
social imaginária, como as pessoas magras, gordas, baixinhas, altas,
etc”, disseram.
Leia a seguir a entrevista:
Agência Aids: Pelas demandas que chegam a ABGLT* (Associação Brasileira
de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais) e nos encontros
que vocês participam, como está a adoção por pais homossexuais
atualmente no Brasil?
Toni Reis e David Harrad: O Estatuto da Criança e do
Adolescente permite que qualquer pessoa solteira adote sem distinção uma
ou mais crianças. Dificuldades têm surgido quando casais do mesmo sexo
querem adotar em conjunto. Neste caso, a adoção conjunta é importante
para o bem-estar da criança, uma vez que na eventualidade de um dos pais
(ou mães) morrer, o/a outro/a fica com a guarda. Caso contrário, pode
acontecer uma briga na justiça pela guarda, como aconteceu no caso do
filho da Cássia Eller.
No entanto, entraves têm ocorrido em algumas Varas da Infância em
relação à adoção homoafetiva conjunta, ou pela falta de precedentes
(insegurança por parte do juiz em dar uma sentença inédita) ou por ações
promovidos por promotores do Ministério Público, alegando, antes da
decisão de 5 de maio de 2011 do Supremo
Tribunal Federal (STF) que reconheceu as uniões homoafetivas como
equiparadas à união estável heterossexual, que casais do mesmo sexo não
formassem uma família nos temos da constituição federal e, portanto, não
podiam adotar em conjunto. No nosso caso, por termos passado por um
grande processo jurídico, levou quase sete anos até conseguirmos adotar
uma criança. Apesar disso, há vários casos de sucesso no Brasil em
relação à adoção conjunta e, depois da decisão do STF, com certeza se
tornará um fenômeno mais comum.
Agência Aids: Como está sendo para vocês serem pais? Fizeram algum tipo de divisão de tarefas na educação do Alyson?
Toni e David: Conhecemos o menino em setembro do ano
passado (2011) e ele veio morar conosco em dezembro. Recebemos a guarda
definitiva (a adoção) em julho deste ano. O nome dele já foi para
alteração no registro civil, conforme determina a lei. Seu novo nome
será Alyson Miguel Harrad Reis, e na nova certidão de nascimento dele
terá dois pais.
Foi o que é chamada de “adoção tardia”, ou seja, já não é mais um bebê
ou uma criança novinha. Agora o Alyson tem 11 anos. Pela idade, ele já
trouxe toda uma formação anterior, bem como as marcas da situação que
levou a família dele perder o pátrio poder e sua jornada em vários
abrigos à espera da adoção durante vários anos. Assim, tivemos alguns
momentos difíceis no início da nossa convivência, em termos de não
querer obedecer, testar limites, etc. E também para ele se adaptar a
nós. Passados oito meses, muitas dessas dificuldades já foram superadas,
embora sempre haja os lapsos característicos de qualquer criança. De
modo geral, estamos todos os três bastante felizes enquanto família.
Em termos da divisão das tarefas, para a maioria das coisas o Alyson já
se vira sozinho. No entanto, é necessário prestar bastante atenção nos
deveres que ele tem que fazer para escolar, e isso nós dividimos entre
os dois. Em termos gerais, Toni é mais uma figura de autoridade, embora
brinque bastante, enquanto o David tende a se preocupar com os cuidados
cotidianos, como a comida, a roupa...
Agência Aids: Na opinião de vocês, a adoção por “dois pais”
requer algum cuidado especial na educação da criança e no que isso possa
representar na sociedade?
Toni e David: Na vida cotidiana em casa, ter dois pais
não impõe qualquer dificuldade. É apenas mais um arranjo familiar. No
mundo lá fora sabemos que pode ser necessário enfrentar o preconceito e a
discriminação e temos conversado bastante sobre isso com o Alyson. É
importante fazer um paralelo com outras formas de preconceito e
discriminação que também existem contra quem não se enquadra na norma
social
imaginária, como as pessoas magras, gordas, baixinhas, altas, etc.
Temos um bom relacionamento com as pedagogas e com o corpo docente da
escola dele, e desde o início todos estão cientes de toda a situação do
Alyson. Ele não esconde dos outros estudantes o fato de ter dois pais e
sabe se defender de eventuais comentários negativos a este respeito.
Agência Aids: Está certo pensarmos em “dois pais”? Será assim que vocês se identificarão para ele?
Toni e David: Sim, está certo pensarmos em dois pais.
Como o David é inglês, para diferenciar quando os dois estão juntos, ele
chama o Toni de “pai” e o David de “daddy”, mas também chama o David de
“pai” quando o Toni não está presente.
Agência Aids: Neste Dia dos País, que mensagem vocês deixam para todos os homens homossexuais que querem ser pai?
Toni e David: Se têm toda certeza que querem ser pai,
que sigam em frente e realizem seu sonho e contribuam para que uma
criança que precisa, tenha um lar, amor e educação. Um conselho: apesar
de poder ter dó da criança pelo que possa ter sofrido, procurem não
manifestar isso para ela. É preciso ser firme e criar a criança como
qualquer outra, sem diferenciação e com educação e amor.
Lucas Bonanno
Adotado por David Harrad e Toni Reis, Alyson terá dois pais em sua nova certidão de nascimento
Publicação por: Grupo Contra o Preconceito on 09:35. - No comments
*Toni Reis é Presidente da ABGLT
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