Exma. Sra. Deputada Federal Manuela D`Ávila,
Com nossos cordiais cumprimentos vimos, por meio desta,
solidarizar-nos com vossa atuação na liderança da comissão de direitos humanos
da Câmara Federal. Temos acompanhado seu incansável trabalho para garantia da
dignidade humana de milhões de brasileiros e brasileiras.
O motivo da publicação desta carta pública é o fato que nos chegou no
fim deste dia (04/10/2011) e que nos deixa bastante preocupados. Soubemos por
meio de uma notícia no site da câmara que a banca evangélica conseguiu adiar a
votação do estatuto da juventude por conta de referências aos direitos humanos
da juventude LGBT brasileira. Sabedores de que a relatoria do projeto é de sua
autoria direcionamos esta carta à senhora crentes de que o conteúdo da mesma
será repassado a todos os deputados e deputadas federais.
É importante lembrar que a sexualidade é algo inerente à pessoa
humana e que o direito à livre orientação sexual e identidade de gênero deve ser
respeitado pelo congresso nacional. A juventude LGBT deve ter garantido no
Estatuto da Juventude as demandas específicas já que o mesmo também contempla
pautas de outros grupos mais vulneráveis na sociedade.
A juventude gay brasileira é um dos segmentos populacionais mais
vulneráveis. Um estudo do professor Fernando Teixeira da UNESP aponta que um
adolescente e/ou jovem gay possui 5 (cinco) vezes mais chances de cometer
suicídio em relação a um adolescente/jovem heterossexual. Esse dado evidencia a
realidade de opressão, perseguição e discriminação a que estamos diariamente
submetidos no Brasil.
Diante dessa situação estamos bastante preocupados com as
dificuldades de acesso à saúde da juventude gay brasileira. Sobretudo, a saúde
mental. Temos um sistema de saúde público que ainda não chega na ponta e não
atende grupos vulneráveis como os jovens gays. Essa tortura psicológica que
passamos primeiro na família, depois na escola, na universidade, alimentada e
estimulada por discursos de fundamentalistas e políticos evangélicos tem
contribuído, significativamente, para o aumento da violência e intolerância com
a juventude gay no Brasil.
Discriminados na família, perseguidos na escola, sem acesso às
políticas públicas ficamos vulneráveis ao envolvimento com consumo abusivo de
álcool e outras drogas, temos ainda mais dificuldade de acesso ao mercado formal
de trabalho que contribui de forma decisiva para o envolvimento com a
criminalidade.
O relatório anual de assassinatos de homossexuais no Brasil,
produzido pelo Grupo Gay da Bahia desde 1.980, aponta índices alarmantes de
crimes de ódio contra adolescentes e jovens gays no país. Há cerca de trinta
dias um jovem gay de 25 anos foi brutalmente assassinado em Alfenas, no interior
de Minas Gerais. Gilvan
Firmino Pereira teve o crânio esmagado depois de receber diversas facadas. Seu
pênis foi encontrado dentro de sua boca e o assassino tentou ainda comer o seu
fígado, que foi assado em um grill elétrico. E assim tem sido a realidade
de ódio e intolerância contra milhões de jovens homossexuais brasileiros. Ser
gay no Brasil é correr risco de vida 24 horas por dia. A homofobia tem nos
expulsado de casa, da escola, do mercado formal de trabalho. Tem nos espancado
na avenida paulista em São Paulo e, sobretudo, no interior do Brasil. Em cidades
aonde a mídia não chega os casos brutais de violência e intolerância contra
nossa população parecem não ser reais para muitos deputados e deputadas
federais.
Senhora Deputada. Conhecemos sua disposição de luta. Mulher
batalhadora que venceu o machismo e continua sendo referência e espelho para que
mais mulheres estejam no espaço de representação e poder político. Um espaço
ainda machista, cruel e reflexo de interesses de alguns coronéis, ditadores,
fundamentalistas, profissionais da política, saudosos do autoritarismo da
ditadura militar. Deputados que desrespeitam a constituição cidadã, que não
respeita o povo brasileiro e nem a diversidade que existe nesse Brasil que
amamos tanto.
Solicitamos, encarecidamente, que articule o apoio dos deputados
federais integrantes da Frente Parlamentar pela cidadania LGBT e da Frente
Parlamentar Mista em defesa da Juventude para que nossa dignidade humana não
seja, mais uma vez, tratada como moeda de troca por interesses políticos.
Pedimos a nobre deputada que junto com os Exmos. Deputados Jean Wyllys, grande
porta-voz da população LGBT e, Deputado Reginaldo Lopes, grande defensor da
juventude brasileira, articule a base aliada da Presidenta Dilma para que o
Estatuto da Juventude – debatido e construído há muitos anos com ampla
participação da sociedade civil e dos parlamentares realmente interessados na
pauta da juventude – seja aprovado na sua integralidade.
Queremos crer que a Câmara dos Deputados não permitirá que o Estado
laico seja novamente desrespeitado, que a realidade de violação diária dos
direitos humanos dos jovens gays seja ignorada pelos nobres deputados e
deputadas federais.
Queremos apenas o direito à vida, ao respeito, à dignidade. Peça à
Câmara que não negue isso à juventude gay do nosso Brasil! Se o Estatuto for
aprovado com a retira dos artigos que dizem respeito à garantia dos direitos
humanos da juventude gay brasileira a Câmara Federal terá dado mais uma prova de
autoritarismo, conservadorismo e discriminação por orientação sexual e
identidade de gênero.
“Porque sonhamos e podemos. Queremos trabalhar, estudar e nos
divertir. Da nossa forma colorida e sem limites. Com guitarras ou skates, livros
e muitas canções. Queremos nossos direitos. Da nossa forma responsável e
despojada. Somos uma nova geração de indignados e, assim, revolucionários cheios
de sentimentos de amor. Nosso palco são as ruas. Nossas armas, as pessoas que
lutam” (Louise Caroline).
Certos de contar com todo empenho, força e resistência aos ataques do
fundamentalismo e da ditadura religiosa e política que se instalou no Congresso
Nacional.
Atenciosamente,
Carlos Bem
Coordenador da Articulação Brasileira de Jovens
Gays
Diretor de Direitos Humanos da União Estadual de Estudantes do Estado
de Minas Gerais
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